Em 1983, uma nova fase do programa começou, trazendo mudanças marcantes no elenco, na produção e até mesmo na forma como as histórias eram contadas. Fique comigo até o final para descobrir os bastidores dessa transição, as curiosidades das gravações e como essa temporada conquistou fãs de todo o Brasil.
TEXTO E PESQUISA DE LUÍS HENRIQUE
Nova fase, novos atores…
No ano de 1983, o Sítio do Picapau Amarelo iniciava mais uma temporada de aventuras, marcada por mudanças significativas. A direção ficou a cargo de Fábio Sabag e Roberto Vignatti, produção de Paulo Resende e com textos assinados por Wilson Rocha, Sylvan Paezzo e Marcos Rey.
Uma das principais alterações foi o fim das histórias com duração mínima de vinte capítulos. Essa decisão foi tomada porque as produções de histórias semanais não se mostraram viáveis para a emissora, tanto do ponto de vista financeiro quanto criativo. As historias dessa fase variavam de 25 a 35 episodios.
Os diretores explicaram que, com narrativas mais longas, era possível desenvolver melhor os temas, enriquecendo as histórias tanto em conteúdo quanto em qualidade visual. Na realidade, principalmente mexia menos no financeiro da emissora.
Após cinco anos interpretando Emília no Sítio do Picapau Amarelo, Reny de Oliveira decidiu que era hora de deixar o papel. Ela já havia anunciado, meses antes do programa finalizar em 1982, que não continuaria na personagem no ano seguinte. Apesar disso, Reny aceitou retornar apenas para o episódio Reinações de Narizinho, com a condição de que a personagem não tivesse destaque.
Com a saída de Reny, a produção precisou buscar uma nova atriz para viver a bonequinha de pano. Aparecerem 36 candidatas para a primeira seleção, na qual foi diminuído para doze. O nome mais cotado na época foi o de Sônia de Paula, que já havia interpretado a boneca Ignácia no episódio Olhos de Retrós e era a favorita de Zilka Salaberry. Outras candidatas incluíam Isabela Garcia, irmã de Rosana Garcia, e Bia Lessa, que também participaram dos testes.
Embora Geraldo Casé tenha ficado impressionado com o teste de Sônia de Paula, a decisão mudou quando Suzana Abranches apareceu de última hora, pedindo ao diretor uma oportunidade de mostrar seu talento.
O desempenho de Suzana conquistou a produção, e ela foi escolhida como a nova Emília do Sítio do Picapau Amarelo. Casé contou que a decisão foi tomada na tarde de uma terça-feira em uma reunião junto de Boni e Edwaldo Pacote.
Na época com 22 anos, Suzana recebeu elogios de Geraldo Casé, que declarou:
“A Suzana será nossa Emília de menor estatura e a mais bem-humorada. Foi incrível a garra com que ela se entregou aos testes. A escolha foi difícil, pois Sônia de Paula e Bia Lessa, outras duas finalistas, também tiveram atuações de altíssima qualidade e acabaram contratadas pela Globo. No entanto, investir em novas atrizes é de grande interesse para nós.”
Fábio Sabag também não perdeu tempo em elogiá-la e comentou empolgado sobre sua vitalidade, estatura, olhos grandes, dicção perfeita e o tempo que ela dispunha para a personagem.
Daniele Rodrigues se despediu do Sítio do Picapau Amarelo devido à mudança de sua família para São Paulo. Para assumir o papel da "menina do nariz arrebitado", a produção escolheu Izabella Bicalho, uma atriz mirim que já tinha experiência na televisão e no cinema. Izabella havia participado recentemente da novela Sétimo Sentido e era acostumada à rotina de gravações.
Sua entrada no mundo artístico aconteceu de forma curiosa: durante um evento em 1980 no clube onde seu pai trabalhava, o elenco do Sítio do Picapau Amarelo estava se apresentando. O pai de Rosana Garcia, que era do departamento de atores, notou Izabella brincando no palco com os artistas e conversou com os pais da menina, abrindo caminho para sua carreira ao estrear na novela “Água Viva”.
Em 1982, Izabella também fez uma participação especial no musical Pirlimpimpim, aparecendo em um videoclipe da música Narizinho, interpretada por Bebel Gilberto. No clipe, que contou com um grande elenco de crianças como figurantes, Izabella já demonstrava uma conexão precoce com o universo do Sítio.
Embora tenha feito um teste de vídeo para o papel de Narizinho, Izabella não enfrentou concorrência direta. Acontece que não havia tempo para fazer testes oficialmente, e por acharem Izabella com o porte parecido com o de Daniele, escalaram ela no ato. Nada mal, não é?
Izabella recebeu um convite para atuar em um filme dos Trapalhões no final de 1982. No entanto, como as gravações do filme e do seriado aconteceriam simultaneamente, ela precisou escolher entre os dois projetos. Por conselho de sua mãe, optou pelo Sítio, que oferecia uma oportunidade de maior duração. E sabe quem participou do filme? Daniele Rodrigues!
Início das gravações
As gravações da nova fase do Sítio começaram em 3 de fevereiro de 1983, uma data especial por dois motivos: era o aniversário de Suzana Abranches e também marcou uma surpresa emocionante. Reny de Oliveira, sem avisar, apareceu no set para passar o bastão para Suzana pessoalmente.
Ao assistir às primeiras cenas de Suzana como Emília, Reny não escondeu a emoção: “Ah, meu coração está até descompassado. Afinal, nesses cinco anos, esta é a primeira vez que vejo a Emília sem que eu esteja dentro dela!”Durante a visita, Reny fez um pedido especial a Suzana: “Cuide com carinho da Emília, viu, Suzana. Ela merece. É uma boneca maravilhosa, e a cada dia você terá uma nova surpresa ao interpretá-la.”
Aproveitando o momento, Suzana pediu conselhos sobre como interpretar a personagem. Reny compartilhou algumas dicas valiosas: “Não deixe nunca que outras pessoas deem ordens à Emília. Ela é malcriada, voluntariosa, independente, e esse é o lado mais bonito dela. Se não fizerem as vontades dela, bata o pé no chão, empine o nariz e faça cara de zangada. Mas o mais importante é você sentir a Emília do seu jeito. Isso ninguém pode lhe ensinar, nem mesmo eu.”
Na hora da despedida, em um gesto de humildade e carinho, Reny pediu um autógrafo à nova intérprete de Emília e prometeu guardá-lo com muito cuidado. Porém, em entrevista para o canal, Suzana revelou que Reny estava nervosa no dia e preferiu não se extender no assunto.
Estreia e episódios da nova fase
A nova fase do Sítio do Picapau Amarelo estreou em 7 de março de 1983 com a história Viagem ao Céu, baseada no livro homônimo de Monteiro Lobato. Essa não seria a primeira vez que o livro era adaptado em um episódio, pois em 1978 já havia sido tema da história “Do Outro Lado da Lua”.
No entanto, a programação inicial foi alterada devido à saída repentina de Daniele Rodrigues no ano anterior. Originalmente, o ano de 1983 seria aberto com Reinações de Narizinho, seguido por Viagem ao Céu. Além disso, estavam previstas histórias como O Casamento de Narizinho e Narizinho no País das Maravilhas, mas esses projetos acabaram sendo vetados.
Vale lembrar também que 1983 foi o único ano em que o Sítio foi exibido na hora do almoço, com um horário único de exibição.
Em A Guerra dos Sacis, temos o retorno da personagem Cuquinha. Já em O Gato Félix, uma adaptação fiel ao capítulo de mesmo nome do livro Reinações de Narizinho, Dary Reis, que anteriormente interpretou o Capitão Gancho, assume o papel de General Espadarte.
Cacá Silveira, que abandonou de vez o papel de Escamado, foi substituído por Dênis Derkian como o Príncipe Escamado. Curiosamente, Dênis utilizou uma combinação inusitada: a mesma roupa que Júlio César usou em 1982 ao interpretar o Príncipe Escamado Segundo e a peruca que Cacá Silveira havia usado nos anos 70.
A história Califa por um Dia marcou a despedida de Tonico Pereira, que interpretava o personagem Zé Carneiro. Para substituí-lo, entrou Silveirinha, no papel de Zeca do Pombo. No entanto, ele permaneceu no elenco apenas até o final daquele ano, participando de poucos episódios.
Esse episódio também contou com Marcelo Picchi no papel principal que já havia participado de “A Viagem ao Céu” e trouxe uma participação especial de Rosana Garcia. Após Júlio César aparecer em 1982, nada mais justo do que incluir Rosana em 1983, que interpretou uma das odaliscas na trama.
Por fim, o último episódio da temporada, O Burro Falante, apresenta Osmar Prado e Renato Pupo nos papéis de Pedro Pichorra, um pilantra que tenta roubar o Burro Falante, dublado por Ivan Setta, para transformá-lo em uma atração de circo, e Sr. Ontem, um misterioso homem que possui o estranho hábito de roubar o dia 31 de dezembro dos calendários. Ambos se hospedam no Sítio, deixando a turma desconfiada e cheia de suspeitas.
Um detalhe interessante é que o vestido usado por Suzana Abranches nesse episódio é reutilizado de Reny de Oliveira, no caso, Reny havia usado ele em 1981 em "O Pé de Feijão Mágico", no ano seguinte Baby Consuelo pegou emprestado para o especial “Pirlimpimpim” e por fim Reny ainda o usou em Reinações de Narizinho, sua última história.
Em 1983, o seriado tirou férias em julho, coincidindo com as férias escolares da criançada. Em versões compactadas, com duração de uma semana cada, foram exibidas quatro histórias: A Cuca Vai Pegar (de 1977), Rapunzel (de 1981), Os Piratas do Capitão Gancho (de 1978) e Aí Vem Tom Mix (de 1982).
A TRILHA SONORA QUE NÃO É TRILHA SONORA
Em 1983, o Sítio do Picapau Amarelo contou com um novo responsável pela trilha sonora: Ricardo Villas, que passou a compor temas específicos para os episódios a convite de Roberto Nascimento. O trabalho teve uma ótima repercussão, gerando um grande volume de cartas vindas de todo o Brasil, com espectadores curiosos sobre o autor das músicas. Esse sucesso inspirou a ideia de gravar um disco com as músicas produzidas para o programa naquele ano.
Quando o projeto tomou forma, Villas procurou a Som Livre, gravadora ligada à Rede Globo, para lançar o álbum. No entanto, a gravadora não demonstrou interesse, já que estava envolvida com outros projetos infantis para aquele ano. Apesar disso, não houve impedimento para que o disco fosse produzido por outra gravadora. Assim, as gravações começaram em outubro de 1983, e o álbum foi lançado pela EMI Odeon.
Todas as composições e arranjos foram realizados por Ricardo Villas, em parceria com Geraldo Casé, diretor do Sítio, e os autores Sylvan Paezzo e Wilson Rocha. No entanto, Villas não obteve autorização para usar o título "Sítio do Picapau Amarelo" ou os figurinos característicos dos personagens na capa do álbum.
As ilustrações, feitas por Elvira Helena, responsável pela arte gráfica e programação visual do programa, remetiam sutilmente ao universo do Sítio, mas sem conexão direta com o visual da série.
O disco, intitulado Faz de Conta: Ricardo Villas Vai ao Sítio, trouxe algumas peculiaridades. Todas as músicas foram regravadas especialmente para o álbum. Por exemplo, a canção Mãe Natureza, que na série era interpretada por Marcelo Patelli (intérprete de Pedrinho), ganhou uma nova versão no disco, desta vez cantada por Beto Guedes.
As músicas exibidas no programa eram apresentadas em versões demo, enquanto no álbum receberam arranjos mais elaborados e vocais adicionais. Um exemplo é a música Gato, Gato, tema do episódio Gato Félix. No programa, Ricardo Villas interpretava a canção sozinho; já no disco, a faixa ganhou coro e os vocais de sua filha, Rita, que passou a dividir os vocais com ele.
Outra curiosidade é o tema As Sobrinhas, do episódio Emília Borralheira. Na série, era cantado pelas atrizes Bia Lessa e Cininha de Paula. No disco, a música foi regravada com novas vozes, desta vez por Joyce e Nana Caymmi. Além disso, a faixa Faz de Conta, composta por Villas, Geraldo Casé e Sylvan Paezzo, foi destaque em um episódio do programa, cantada por Reny de Oliveira no episódio A Sobrinha da Cuca. Essa canção acabou se tornando a faixa de abertura do lado B do álbum.
Mesmo assim, o projeto ganhou vida nos palcos. Entre 7 e 11 de abril de 1984, estreou como peça musical no Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, dentro do projeto “Seis e Meia”. O espetáculo contou com roteiro e direção de Geraldo Casé e um elenco formado por Ricardo Villas, David Tygel, Maurício Maestro, Helvius Vilela, Damilton Viana, Dorinha Tapajós, Miriam Peracchi e as crianças Gabriela Ferreira, Rita Calazans e Tatiana Ferreira.
Para divulgar o álbum, Ricardo Villas e sua filha Rita participaram do programa Balão Mágico em 7 de janeiro de 1984, onde apresentaram a música Gato, Gato. No dia 14 do mesmo mês, Gabriela Ferreira também marcou presença no programa, interpretando a música Grão Vizir. Em agosto, o Balão Mágico exibiu um videoclipe da música Cuca Biruta, gravado por Ricardo em externas no Horto Florestal Paulista.
Embora tenha recebido reconhecimento na época, o álbum nunca foi relançado em mídia física ou digital, nem mesmo remasterizado. As únicas exceções são as músicas As Sobrinhas e Voa Foguete, que foram remasterizadas e estão disponíveis nas plataformas digitais
1984
Na temporada de 1984, a primeira história apresentada foi “A Arca da Emília”. Essa trama marcou o retorno de Quindim, além da reintrodução de Ordélia e Mofélia. Na história, Emília fica convencida de que o mundo está prestes a acabar, após uma conversa com o Pequeno Polegar e a ocorrência de estranhos vendavais no Sítio. Por isso, ela procura o Visconde com a ideia de construir uma arca, inspirada na Arca de Noé, para salvar as pessoas até que o perigo passe.
No início do mesmo ano, Suzana foi liberada pela Rede Globo para, paralelamente ao programa, participar da peça “Tiro ao Alvo”.
Na história “A Reinação do Esperto Come Esperto”, o elenco contou com a participação especial de Chico Anysio, que voltaria ao Sítio em 2005 como parte do elenco fixo. Além disso, Luiz Fernando Guimarães e Regina Casé também marcaram presença na trama. Em 25 de fevereiro de 2024, o programa Domingão com Huck homenageou Regina Casé, relembrando sua participação no Sítio e exibindo um depoimento de Suzana Abranches.
Na terceira história, “A Volta do Anjinho”, foi apresentado um reboot do clássico “O Anjinho da Asa Quebrada”. O Anjinho foi interpretado por Gabriela Bicalho, irmã mais nova de Izabella Bicalho, que na época dava vida à Narizinho. Nesse episódio, Suzana Abranches e André Valli apresentaram músicas inéditas que, curiosamente, nunca foram lançadas.
A última história dessa fase foi “Barba Azul, o Cara de Coruja”, que contou com um grande elenco de personagens de contos de fadas invadindo o Sítio. A trama foi desenvolvida ao longo de 65 capítulos. Este episódio marcou a despedida de dois atores importantes do seriado: Canarinho (que interpretava Garnizé) e Ivan Senna (João Perfeito). O vilão Barba Azul foi vivido pelo renomado ator José de Abreu.
Em março de 1984, o horário de exibição do programa infantil foi alterado, passando a ser reprisado pela manhã. A mudança tinha como objetivo ampliar o público, alcançando também adolescentes e adultos.
Essa fase do programa manteve o foco na musicalidade, seguindo a linha da temporada anterior. Ricardo Villas chegou a mencionar planos de lançar uma nova trilha sonora com as canções, mas, por razões desconhecidas, o projeto não foi concretizado.
Nessa fase, ficou evidente como Patelli e Izabella já estavam mais crescidos. Para evitar repetir o erro de manter Pedrinho e Narizinho adultos, destoando completamente da proposta do programa, 1984 seria o último ano da dupla no elenco.
Anos mais tarde, em 1989, André Valli contracenou novamente com Izabella Bicalho na novela Pacto de Sangue. Desta vez, os dois interpretaram um casal romântico. Na época, Izabella tinha apenas 17 anos, mas, considerando o período em que a novela era ambientada, era comum que jovens dessa idade já estivessem casadas.
E assim encerramos essa viagem mágica pela história do Sítio do Picapau Amarelo em 1983 e 1984, uma fase repleta de mudanças, novos talentos e muita criatividade. Espero que você tenha gostado de relembrar esses momentos icônicos. Se você curtiu, o texto pode conferir ele em formato video no link abaixo:
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